Como o RH pode se prevenir contra fraudes em atestados clínicos?

Como o RH pode se prevenir contra fraudes em atestados clínicos?

Nos últimos dois anos, o número de atestados médicos referentes à saúde mental aumentou em 30%, segundo pesquisa realizada pela startup de Gestão de Saúde, Closecare. As enfermidades que impactam o emocional já representam a terceira maior justificativa de afastamentos e, de acordo com estudos recentes, em menos de 10 anos tendem a ser a principal causa.

Todavia, do mesmo modo que as organizações devem se atentar ao bem-estar mental de seus colaboradores, elas também precisam se precaver para que, em meio a casos que necessitam de real atenção, fraudes não passem despercebidas. Ainda segundo a empresa de saúde, 13% dos atestados entregues anualmente ao RH – desta vez levando em consideração todas as motivações e não somente os casos que envolvem doenças psicoemocionais – não deveriam ser validados pelas organizações.

Mas o que há de “errado” com estes atestados? Ao que, exatamente, os RHs precisam estar ligados antes de aceitar o documento entregue pelo colaborador? Para entender melhor as fraudes, vamos por partes.

Prejuízo bilionário

Anualmente, milhões de atestados médicos são entregues às organizações. Para se ter uma ideia, estima-se que, somente no recorte dos 13% de documentos que não deveriam ser validados, R$ 7 bilhões em gastos poderiam ser evitados caso o gerenciamento organizacional seguisse à risca as normas que envolvem a documentação médica.

De acordo com André Camargo, CEO e fundador da Closecare, por mais que nem sempre a entrega de um atestado gere desconfiança na área de Recursos Humanos, ainda assim os profissionais do setor, ao recebê-lo, precisam se atentar a algumas informações obrigatórias. A primeira delas envolve a ausência do número do CRM.

O registro médico do Conselho Regional de Medicina é determinante para a legalização de um atestado. Não é incomum que muitos sejam entregues com a informação ausente ou com CRM falso, inativo ou cancelado – cujo carimbo, por vezes, sequer é feito pelo médico que atendeu o paciente.

Todas essas situações tornam o atestado inválido, mas, apesar da checagem ser fundamental, o excesso de trabalho faz com que a equipe responsável não consiga realizar o procedimento de forma adequada, e muitos documentos com problema são validados. “Uma das soluções para essa questão está no uso de robôs, que fazem a verificação automática do CRM em bases de dados oficiais”, revela Camargo.

Informações devem ser compreendidas

Atire a primeira pedra quem nunca se deparou com um documento ou receita médica cuja caligrafia deu calafrios. Pois bem, apesar do costume, no caso dos atestados isso pode ser um problema tanto para a empresa quanto para o colaborador. O fato é que, segundo o executivo, as companhias podem se recusar a receber documentos que não são capazes de serem compreendidos.

Além disso, um outro ponto de atenção diz respeito à ausência de informações importantes. Os atestados de horas, por exemplo, exigem que o período exato de atendimento seja discriminado. É de se desconfiar quando termos como “a manhã toda” são utilizados para justificar o tempo no qual o colaborador esteve sob cuidados hospitalares.

A mesma regra vale para a ausência como acompanhante. Se o não comparecimento ao trabalho é motivada porque o funcionário precisou acompanhar um dependente, o nome do mesmo precisa constar no atestado médico. “Para este tipo de documento, a conduta correta por parte do RH é abonar o período exato de atendimento que está descrito no atestado, mais o tempo de deslocamento da pessoa até a unidade de saúde”, afirma Camargo.

Graves consequências ao colaborador

Quando sua empresa não te libera para uma emenda de feriado, bate aquela vontade de apresentar um atestado para garantir um descanso a mais? Se sim, aqui vai uma dica importante: permaneça apenas na vontade. A apresentação de atestados falsos, de acordo com a advogada Nicole Fanucchi, pode terminar em uma justa causa.

“Antes de mais nada, é preciso lembrar que o atestado médico é um documento legítimo e reconhecido pelas leis trabalhistas, já que nestes casos, o médico é a autoridade no assunto para determinar quanto tempo essa pessoa precisa ficar afastada para sua recuperação. A apresentação do documento garante que esse período de ausência não seja descontado de seu salário. Agora, ao apresentar um documento falso, o empregado estará sujeito às sanções legais decorrentes da sua atitude, o que inclui ser demitido por justa causa”, pontua.

Segundo Monica Mahuad, Gerente de Departamento Pessoal da Almeida Kruger, em alguns períodos específicos, como as épocas de feriados, a incidência de atestados falsos tende a aumentar. Entretanto, alguns pontos “facilitam” que os erros sejam identificados. 

“Quando recebemos o documento nestas épocas do ano, sempre nos debruçamos com afinco em cima deles e, infelizmente, em uma dessas oportunidades vimos que o atestado era falso, já que a irmã de uma pessoa trabalhava na clínica e forneceu o documento. Sempre olhamos os pequenos detalhes, uma mínima rasura que seja já é motivo de desconfiança. Outro ponto que também nos auxilia atualmente é a tecnologia. Geralmente recebemos a foto do atestado e assim fica ainda mais fácil, já que temos a opção de aumentar a imagem”, salienta.

A partir da entrega do atestado médico até sua comprovação de ilegalidade, pode levar um tempo, já que é preciso seguir alguns passos. Porém a identificação de inverdades no documento pode não ser uma jornada complexa, como explica a profissional de RH.

“Ao haver o recebimento e a desconfiança, a primeira coisa que fazemos é entrar em contato com o médico, clínica ou hospital para vermos se a pessoa esteve lá mesmo, se as informações que ela nos passou estão corretas e se os dias de afastamento que o médico indicou estão condizentes. Os profissionais da saúde sempre respondem rápido e caso haja conflito nas informações, nos é enviado um laudo do médico, falando que aquele documento foi adulterado”, elucida Monica.

Além da justa causa

Levar uma justa causa já representa uma consequência “pesada”, por assim dizer, mas a punição pode ir além. Na última segunda-feira (6), um rapaz de 31 anos foi preso em Canoas (RS) por apresentar um atestado médico falso. Sua intenção era apenas faltar um dia de trabalho e, agora, há o risco dele pegar cinco anos de prisão.

Ao portal Diário de Canoas, o delegado Rafael Sauthier, da Delegacia da Polícia Civil de Estância Velha, explicou que o preso teve conduta criminosa por adulteração de documento público – o atestado falso estava com identificação de um posto de saúde local.

“As pessoas acham que não dá nada encaminhar um atestado falso, mas acredito que este caso vá servir de alerta para a seriedade do assunto. Ele queria só faltar um dia de trabalho, mas acabou preso”, declarou Sauthier ao portal gaúcho. O delegado afirma, ainda, haver a suspeita de um esquema de emissão de atestados na região.

É sempre importante destacar que as consequências podem impactar também o profissional de saúde envolvido com qualquer documentação falsa. O médico coordenador do Programa Priori, da Paraná Clínicas, empresa do Grupo SulAmérica, Eduardo Senter, enfatiza que “a emissão do documento falso pelo médico é condenada por meio do Código de Ética do Conselho Federal de Medicina, ou seja, não é porque a pessoa é amiga do profissional que este pode lhe dar um atestado. As sanções da lei neste caso recaem também sobre o profissional de saúde”.

Investimento em saúde mental

Como os atestados relacionados à saúde emocional entraram em uma onda crescente – especialmente por conta da pandemia da Covid-19 -, o melhor que as empresas têm a fazer é trabalhar de forma precatória e não apenas reativa. Segundo Karen Salirrosas, Diretora Médica Executiva da Smart Doctor, garantir o bem-estar dos colaboradores é uma ação estratégica, já que “a manutenção da saúde física, emocional e mental adequada, bem como a comunicação eficaz entre os pares, faz com que os colaboradores desempenhem suas tarefas com eficiência”.

A especialista da healthtech voltada à prevenção esclarece que nos últimos anos algumas patologias aumentaram, o que só reforça o quanto o ambiente profissional precisa estar mais envolvido com trabalhos precatórios e acolhedores. Entre os dados trazidos por ela, destacam-se:

  • Cerca de 80% dos colaboradores apresentaram ou apresentarão lesões nos músculos, tendões, articulações, ligamentos e ossos associados a posturas inadequadas durante o turno de trabalho;
  • Quase 60% da população latino-americana está com sobrepeso ou obesidade;
  • O nível de Burnout e fadiga mental no local de trabalho está aumentando, atingindo quase 80% dos trabalhadores latino-americanos;
  • Mais de 90% relatam que o estresse ou a ansiedade afetam a qualidade de seu trabalho e as relações interpessoais.

“As empresas devem compreender que seus problemas de absenteísmo, presenteísmo, rotatividade, diminuição de produtividade, estão intimamente relacionados ao estado de saúde de seus funcionários e que uma abordagem adequada pode reverter seus números. Ter programas de saúde preventivos adaptados às necessidades individuais das pessoas que compõem as equipes de trabalho e que atuam física, mental e nutricionalmente, gerará uma diminuição do absentismo laboral por doença, nos custos de saúde atendimento (que de outra forma pode chegar a R$ 21 mil por funcionário)”, finaliza.

 

Fonte: RH Pra Você